segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

janela riscada sobre verde

Escrito assim, como não querendo que mais ninguém leia, uma mensagem riscada por desconhecidos, cifrada na intenção e no destinatário.
Um dia passamos e já não está, dissolvida por jactos de limpeza, mudanças de dono e outros projectos.
O efémero também é um sinal, um discurso inteiro que não precisa de ficar escrito. Não há sinal gráfico para ele. Basta a sugestão e parece que faz da atenção refém, com uma ameaça que, de não expressa, ainda nos parece mais violenta.
E há o verde esbatido dos azulejos, gasto como as memórias, a pedra manchada, o polimento do corrimão tocado por inúmeras mãos.
Ali, ao sol, a janela rabiscada tem um molho de histórias, promessas que nunca saberemos resolver.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

ligeira

Hoje vou pegar na minha bagagem de boa disposição e outros essenciais, andar por aí e não deixar que nada me aborreça. Tiro o dia para me mimar e contrariar a predisposição geral para a crise. Já tentei fazer uma lista mental das coisas que me agradariam neste momento: ficar ao sol de olhos fechados, a ouvir música; sentar-me numa esplanada com borrachinhas nos ouvidos e ficar a observar as caras e os tiques de quem se senta à volta; ler um bocadinho coisas daquelas que nãos nos fazem ter vontade de saltar para a página seguinte porque estão bem escritas e nos dão prazer; arrastar-me pela rua a contrariar a pressa dos outros; sentir o vento na cara e o cheiro do mar. A lista é demasiado grande para decidir agora. Um passo de cada vez. Vou sair de casa e deixar-me levar. Não me procurem, porque a vossa vontade contraria sempre a minha e isso enerva-me. Quero estar sozinha porque as pessoas já não sabem estar com as outras sem tentar impingir-lhes qualquer coisa para fazer que as torne, aos seus e aos nossos olhos, pessoas mais interessantes e aparentemente vivas. Hoje, se fizerem favor, vão-se lixar, porque eu quero saborear o simples facto de estar por aqui, sem ter de, nem querer acreditar em nada de especial. Tiro férias de quereres.