domingo, 31 de março de 2013

energia

Ilustração MMFerreira
Gosto de chegar a cara às plantas, às flores, à relva e sentir aquele formigueirinho quase imperceptível, a energia que anda à roda das coisas. Gosto de a sentir no vento que também traz outras energias e nos agita de novo para a vida. Antes preocupava-me a falta de energia e o cansaço, até perceber que nunca falha à nossa volta, que é inesgotável e que basta saber por onde anda para recarregar baterias. Amanhã, segunda-feira, vai haver mais, vai haver tudo de novo, energia, alegria e vida, muita vida.

quinta-feira, 21 de março de 2013

da paz

Não gosto de extremos. Comunistas e fascistas sempre tiveram para mim o contra do totalitarismo. E eu sou pela liberdade. Também não gosto de monárquicos porque acho que ninguém precisa de se pôr em bicos de pés se tiver uma boa auto-estima, nem acredito que o nascimento conceda outros direitos do que os de existir em igualdade de termos com toda a gente. E gente que acha que sabe, pensa ou pode mais do que os outros é sempre um triste espectáculo e exemplo de si mesma. Abomino igualmente o terrorismo e a pena de morte. Não me sinto obrigada a concordar ou a participar de nenhum deles e espero nunca estar na circunstância de ter de o demonstrar. Perante a escolha de matar ou sofrer a morte, espero ter a força de espírito necessária para abraçar o meu fim sem ter de passar pelo tormento de condenar outra pessoa a isso. Não gosto de extremos, mas entendo os contrastes e contra as atitudes radicais sugiro os limites, de preferência os pessoais, que são o único território natural de quem existe. Procurei sempre a paz, mesmo quando incapaz de agir em coerência com a sua experiência. Sou tranquila, mesmo quando a paixão parece sugerir o contrário. Quem me lê com honestidade sabe bem quem sou.

terça-feira, 19 de março de 2013

os pequenos ladrões

Os pequenos ladrões - Ilustração MMFerreira
Deve ter ficado da inquisição ou dos idos tempos da pide, esta mentalidade dos pequenos ladrões que, por alguma ironia do destino, acreditam que a justiça nunca se preocupará o suficiente com eles para os perseguir. É a mentalidade do triste eleito no último escrutínio português, em que conseguiu convencer um considerável número de pessoas que era melhor do que os outros. Aproveitou o desânimo geral para criar esperanças de mudança, como qualquer vendedor de pontes sobre o Tejo ou de Rossios, instalou-se num poder que, obviamente, se encontra destituído de mecanismos de controlo, e apressou-se a contratar outros pequenos ladrões para o seu gangue. A finalidade é vender rapidamente o País aos grandes ladrões, que por falta da tão crucial honestidade pessoal também acreditam que ficarão impunes para todo o sempre, têm como objectivo controlar, dos seus escritórios virtuais, o mundo inteiro. No final desta história, vão viver felizes num qualquer bunker escondido das multidões escravizadas e enfurecidas, muito felizes com as suas incomensuráveis fortunas e aterrorizados com a possibilidade de os descobrirem e voltarem a tirar o que tão vilmente arrecadaram.
A história dos pequenos e grandes ladrões nunca é gloriosa nem feliz. Mas é especialmente triste porque os seus personagens se iludem com a ideia de que são muito mais espertos e capazes do que os outros. Alheados da realidade, são incapazes de avaliar as consequências dos seus actos e, quando isso acontece, tudo o que lhes resta é o instinto sobrevivência dos animais acossados, desesperados e em permanente fuga dos seus predadores. São alcateias que acabam por se lançar no precipício por falta de outra direcção de fuga. E, nessa altura, onde está o poder e a glória que tão desastradamente construíram?
Os pequenos ladrões são sempre infames e desgraçados, cães selvagens cujas dentadas se fincam na sua própria carne. O seu destino é sempre tenebroso porque não há futuro nem progresso na ausência de consciência. E os heróis são sempre os que chegam depois.

quinta-feira, 14 de março de 2013

abraços e café

Ilustração: MaritaMorenoFerreira
Toda a gente gosta de abraços, assim à laia de cachecol fofo enrolado à volta do pescoço, confortável, quente, macio. Sensação boa, familiar, protectora. Até os oferecem na rua, momentos de boa vontade que são como bandeiras de alerta mais de quem oferece do que de quem recebe.
Pois a mim não me agradam os abraços vindos do nada, de gente desconhecida que acha natural irromper de repente pelos nossos meios metros de privacidade e forçar uma intimidade inexistente. Quem são esses santos da carência que de repente se envolvem nessa cruzada afectiva e esperam o apreciado retorno?
Bem sei que também é santo aceitar e entender a dádiva na sua verdadeira intenção, mas prefiro a zona de conforto do sofá e uma caneca de café quente, mais um abraço de quem de facto está perto de mim.
Que me perdoem os espontâneos abraçadores de rua, pois até aceito um abraço desconhecido vindo até a mim num momento de necessidade. Abraço também qualquer desconhecido noutros momentos igualmente necessários. Mas não me sinto confortável a receber abraços que me parecem mais gritos de ansiedade do que cachecóis afectivos.
Parece-me mais adequado trocar o abraço vindo do nada por um café quente e uma conversa vinda de pequenos nadas, antes de passar às trocas energéticas mais complexas. É o que me parece.

segunda-feira, 11 de março de 2013

queres?

Foto MMFerreira
Chega ali à beira-mar, saca o giz do bolso e escreve a sua declaração. Acrescenta-lhe um coração, não vá o objecto da sua inspiração trocar-lhe o sentido e, assim, pelo menos, o boneco não engana. Se bem que o sítio que escolheu seja, apesar de tudo, o local onde todo o mundo assenta os traseiros, sem cerimónia, sem ligar à mensagem rabiscada a branco na tábua do meio. É lá sítio para fazer uma declaração, aquele que serve para aparar os ditos cujos de todo o mundo... Se fosse eu, afinava, mas o autor da dita, nublado como devia estar pela cegueira da paixão, com certeza não perdeu tempo com isso. E até deve ter sido surpreendido pela questão logo levantada: então, uma declaração num sítio de assentar traseiros e, possivelmente, arejar alguns excessos gasosos intestinais? Quando se é simpático, apaixonado e essas coisas não se pensa assim e todos os meios são bons para um elevado fim. Portanto, queres namorar comigo? (coração) no assento de todos os back sides passeantes é uma fórmula tão boa como qualquer outra. Queres?